Nos dias de hoje são
comuns – e é crescente na mídia o espaço para – programas de TV voltados aos
cuidados com a saúde e bem estar do corpo. A razão é simples: todos nós
desejamos manter a saúde em dia, sobretudo em um mundo cheio de elementos que
vão de encontro com este desiderato. Procuramos conciliar a correria do dia a
dia com o momento para uma boa alimentação e a prática de exercícios físicos, o
que nem sempre é possível.
Mas não é somente o perfil
do cidadão atual – que não tem tempo para cuidar do corpo, que nos faz refletir
a respeito da saúde. Eu, particularmente, passei a refletir mais a respeito de
manter-me saudável por outro motivo: a possível necessidade de utilização do serviço
público de saúde.
***
Eu estava trabalhando no
escritório em que estagio em uma tarde comum, como qualquer outra, quando de
repente senti um incômodo no olho: a sensação era de um cisco, mas não dava
para ter certeza do que se tratava. Aliás, quando se trata de algo dentro olho,
tudo parece a dimensão de um elefante.
Relutei por algum tempo,
na esperança de que o “corpo estranho” pudesse sair do olho, mas sem sucesso.
Chegou ao ponto de ter sido dispensado do trabalho por não conseguir me
concentrar no serviço.
Com dificuldade fui para
casa e, chegando lá, deitei na cama e fechei os olhos. Queria poder dormir e
acordar sem sentir nada, mas infelizmente apenas dei algumas cochiladas e,
quando resolvi levantar da cama para comer algo, a porcaria do cisto ainda estava
lá, incomodando, irritando, chegando ao ponto de doer.
Sem esperança de que a
sujeira fosse sair “sozinha” do meu olho, decidi ir ao pronto atendimento no
hospital de minha cidade. Há de se ressaltar que a decisão foi pensada, pois já
havia necessitado do serviço público de saúde e dele tinha péssimas
recordações. Lá chegando tive de esperar quase uma hora para ser chamado – e o
olho seguia doendo. Até que uma voz incisiva chamou pelo meu nome. Era a
enfermeira, com cara de poucos amigos – ou nenhum.
Entrei no pronto
atendimento e fui encaminhado para a sala de exames prévios: verificação de
pressão, pulsação, questionário sobre alergias e doenças que pudessem
influenciar no tratamento a ser ministrado. E a cada pergunta feita aquela voz
áspera penetrava em meus ouvidos. Chegou ao ponto de eu ter de responder no
mesmo tom de arrogância (até porque eu estava extremamente irritado com aquela
situação toda). Pelo menos com o tom que passei a utilizar nas respostas a
enfermeira ficou mais “querida”, mais simpática. O que deu para notar, quando
fui encaminhado para uma das salas da enfermaria, era o fato de ela estar tendo
algum desentendimento com o médico plantonista. Mas, e daí?!, eu não tinha nada
a ver com isso, e não era em mim e nos demais pacientes que ela teria de
descontar seus problemas.
Na sala da enfermaria
fiquei uns dez minutos até um técnico em enfermagem vir me atender e pingar
duas gotas de colírio anestésico no meu olho esquerdo. Depois disso, tive de
esperar mais uns quinze minutos até que o médico viesse ver do que se tratava.
Nesses períodos de espera é que refleti a respeito da saúde, e dos cuidados a
serem tomados com ela, para jamais depender do hospital público. Pois não era
somente eu que precisava do atendimento e teve de esperar longo tempo até ser
atendido – e mal atendido. Havia pessoas com dor, gemendo, outras totalmente
entregues à febre, à gripe, a enjoos... E o descaso com essas pessoas
considerado corriqueiro pelos profissionais da saúde que ali perambulavam.
Foi aí que tomei uma
decisão: cuidarei cada vez mais da minha saúde, para não precisar de um serviço
precário, que mal enxerga a pessoa humana por traz do problema que a traz até
aquelas condições. É claro que o caso do olho era algo que não dependia de
caminhadas diárias e de uma alimentação balanceada; era fruto do acaso. Mas
tirando essas situações emergenciais, pronto atendimento nunca mais.
***
Depois de mexer de todos
os modos no meu olho, e de banhar-lhe com um soro fisiológico, o médico pediu
se eu ainda sentia algum incômodo. Respondi que não e questionei se o fato de
eu não sentir mais nada não poderia estar atrelado ao efeito anestésico. A
resposta do médico fora negativa, afirmando que eu sentiria o corpo estranho mesmo
com o olho anestesiado, e me dispensou. Saí de lá tranquilo.
Cheguei em casa e me
instalei na cama para ver a final da Libertadores (e “secar” o Corinthians),
quando, em cinco minutos, comecei a sentir, dentro do olho, o cisco e a
importuna dor que o acompanhava. E pensei comigo mesmo: “maldito serviço
público de saúde, maldito anestésico”.