quarta-feira, 27 de julho de 2011

Amigo quadrúpede

Sempre gostei de animais, sobretudo os meus animais de estimação. Tenho um gato, o Theodoro, de 12 anos e 9 meses, além de três cadelas: a Tutty, da raça Dachshund (mais conhecido como linguiça), a Kirah, e a Raika, filha da Kirah, ambas da raça Dálmata. São anos de convivência e de fiel companheirismo com esses adoráveis animais.

A Raika é a caçula da família. Por ser mais nova, é também a mais agitada, bagunceira, e ao mesmo tempo, a mais medrosa e carente das três. Ao nascer teve a companhia de 16 irmãos, com quem teve de dividir o leite de sua mãe. Infelizmente, dos 17 filhotes da Kirah, apenas 8 conseguiram sobreviver. Não havia leite para todos, e embora minha eu e minha família tenhamos nos engajado em amamentar os filhotes, o esforço não teve o devido resultado.

Acordávamos cedo, e de forma revezada dávamos leite, em uma pequena mamadeira, aos filhotes menos favorecidos na concorrência pelas mamas da Kirah. Dentre os amamentados, a Raika, com sua inconfundível manchinha em forma de "paus" na testa. Os demais foram vendidos e doados. Ficamos com aquela que mais nos cativou.

Enquanto eu lia a obra de John Grogan, "Marley & Eu", admirado com tamanhas encrencas em que o cão protagonista se metia, e o quanto bagunceiro era, ficava imaginando a Raika vindo nos receber à porta, derrubando a tudo e a todos por quem passava no caminho. Ficava lembrando do medo tremendo que ela tem de foguetes, e de um fim de ano em que chegou a ter desencadeada uma desinteria em virtude dos estouros dos fogos. Lembrava do que ela fazia para chamar a atenção quando íamos viajar... estragos e mais estragos!!

E, refletia também no quanto todos nós amamos a para sempre filhote Dálmata.

É claro que amamos também a Kirah, a Tutty e o Theodoro. Mas a Raika, que sempre nos deu preocupação e alegria, hoje nos deixa abatidos e tristes. A filhote para quem dávamaos de mamar está com tumores pelo corpo. Tumores estes malígnos, desencadeadores de câncer. Foi no início da semana que o médico veterinário a examinou, e sem rodeios informou que não há nada o que se possa fazer, e que cedo ou tarde ela irá morrer.

Pensei no mesmo momento que há coisas piores por aí. Pessoas possuem estes problemas e morrem por isso. Ela é apenas um animal.

Mas a  imagem da pequena Raikinha em minha mente me convencem do contrário. Ela transcendeu a categoria de animal de estimação. Ela é membro da família. Ela é um pouco de nossa história, é a representação da fidelidade, do companheirismo sincero. Ela é, assim como os demais animais irmãos desta casa, aquilo que não encontramos nos seres humanos: amor incondicional, capaz de perdoar um castigo, capaz de perdoar um fim de semana de solidão, ao vir correndo e pular em nosso colo, como se dissesse: "obrigado amigo meu, por voltar a esta casa! Eu estava morrendo de saudade, e não me importo que tenha me deixado por dois dias sozinho! O importante é que estás aqui!"

John Grogan, em sua já citada obra, com maestria nos escreve, ao falar de seu cão, Marey:

"... Enquanto envelhecia e adoecia, ensinou-me a manter o otimismo diante diante da adversidade. Principalmente, ele me ensinou sobre a amizade e o altruísmo e, acima de tudo, sobre lealdade incondicional.
Era um conceito interessante que só então, após a morte dele, eu compreendia inteiramente. Marley como mentor. Como professor e exemplo. Seria possível que um cachorro - qualquer cachorro, mas principalmente um absolutamente incontrolável e maluco como o nosso - pudesse mostrar aos seres humanos o que realmente importava na vida? Eu acreditava que sim. Lealdade. Coragem. Devoção. Simplicidade. Alegria. E também as coisas que não tinham importância. Um cão não precisa de carros modernos, palacetes ou roupas de grife. Símbolos de status não significam nada para ele. Um pedaço de madeira encontrado na praia serve. Um cão não julga os outros por sua cor, credo ou classe, mas por quem são por dentro. Um cão não se importa se você é rico ou pobre, educado ou analfabeto, inteligente ou burro. Se você lhe der seu coração, ele lhe dará o dele. É realmente muito simples, mas, mesmo assim, nós humanos, tão mais sábios e sofisticados, sempre tivemos problemas para descobrir o que realmente importa ou não (...)".

Para muitos um exagero. Para mim, não há como estar indiferente com a possibilidade de perda de quem sempre me amou. E esse amor eu vejo no seu olhar.