sábado, 6 de novembro de 2010

Iguais hierarquicamente, difentes no status

Uma colher bem cheia de café granulado; um pacote de adoçante, daqueles de sachê; 2/3 de água bem quente, 1/3 de água fria (assim como meu falecido avô materno, eu não gosto de tomar nada muito quente); uma mexida e.... vamos lá.

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Eu estava estudando para a primeira prova da cadeira de Ética Profissional, lendo os artigos da Lei 8.906 de 4 de julho 1994, o famoso Estatuto da OAB. Nos primeiros artigos, nada de novidade em relação ao que se vê no dia a dia da atuação dos advogados brasileiros. O que chamou a atenção, porém, foi a dicção do caput art. 6º, conforme transcrevo: "Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos". Olha que coisa boa: "não venha, senhor magistrado, querer ser mais do que eu, pois de acordo com o art. 6º do Estatuto da OAB, eu, advogado, sou igual a você, não sou hierarquicamente inferior". Está bem, não há hierarquia, e nem poderia haver, pois são funções distintas e não há relação de subordinação entre eles. Tudo muito correto (sem nenhuma ironia). Só que, na visão geral em relação aos profissionais, sobretudo quanto ao senso comum, "o magistrado é muito mais que o advogado". Assim como o Ministério Público também. É claro que eu sei bem que não é uma questão de subordinação, mas sim de status.

Pensemos a partir do seguinte ponto de vista: de acordo com o art. 93, I, da Constituição Federal de 1988, para o ingresso na carreira da magistratura, é necessário, além do exame da Ordem, concurso público (que não é nem um pouco fácil) e "no mínimo, três anos de atividade jurídica". Essa atividade jurídica, em geral, se dá por meio da advocacia. Para ingressar no Ministério Público, as mesmas exigências são feitas (art. 129, § 3º, CF/1988). A conclusão que se tira disso tudo é que advocacia é pré-requisito para que o profissional esteja apto a atuar como juiz ou promotor de justiça. Podemos ainda, para ilustrar o raciocínio - mesmo sabendo que soará como argumento apelativo -, exemplificar com a seguinte situação: tens diante de ti um bacharel em direito e um doutor em direito. Para ser doutor, é necessário ser bacharel. Quem representa ter maior conhecimento, nesta situação?

Além do que fora dito no parágrafo anterior, não podemos olvidar a realidade da saturação da profissão de advogado. A ideia que se tem (e pelo que se vê no dia a dia, e aqui falo em relação aos profissionais pouco preparados), é um número exagerado de advogados, abraçando causas diversas, e nem sempre realizando um trabalho eficaz.

Diante disto o art. 6º ganha tamanha importância: a de manter a igualdade de tratamento entre os profissionais do direito, através do respeito recíproco e da ética profissional que deve envolver a profissão. Só que a imagem gerada na comparação entre profissionais, não mudará tão fácil, pois intrínseca do pensamento popular, até mesmo porque é o juiz quem sentencia, decidindo o que se postulara. O Ministério Público, por sua vez, vem ganhado cada vez mais espaço no cenário jurídico, pela função social que exerce, e pela boa administração e formação de profissionais.

A importância da base legal em análise vai além da obviedade de seu texto. A advocacia está sendo banalizada por profissionais mal preparados e sem o mínimo de idealismo naquilo que fazem. O ideal que se verifica é a larga conta bancária que a profissão pode gerar. A função  pública é exercida em prol de um interesse individual. Só queria deixar claro que isso não é geral, e o Brasil está repleto de bons e honestos advogados. Porém, alguns poluem a profissão, e fazem com que as pessoas desacreditem em uma profissão milenar, tão bonita e importante para a defesa dos interesses civis em geral, pois, de acordo com o art. 2º do Estatuto, "O advogado é indispensável à administração da justiça".

Deixe-se bem claro, entretanto, que essa classificação comparativa é fruto do senso comum. E reforço dizendo que o artigo fala em hierarquia, e não em status.